Marta
de Lana / Washington Luiz Tafuri
INTRODUÇÃO
O Trypanosoma
cruzi é um protozoário agente etiológico da doença de chagas que constitui
uma antroponose freqüente nas Américas. Este protozoário e a doença foram
descobertos e descritos pelo grande cientista Carlos Ribeiro Justiniano das
Chagas. Chagas estudava a malária e agregou-se a equipe de Osvaldo Crus nos
combate a malaria em Minas Gerais no período de construção da Estrada de Ferro
Central do Brasil.
Imagem barbeiro: Imagem: unicamp.br
Exameniva animais buscando relações com
as patologias da região, em um mico encontrou um hemoflagelado, denominado-o Trypanosoma minasensi, em “chupões” ou
“Barbeiros” insetos hematófagos encontrou outro tripanossoma com cinetoplasto
grande e movimentação intensa. Enviou exemplares para Oswaldo Crus que em seu
laboratório comprovou a suspeita de Chagas de que este tripanosoma deveria ser
uma espécie nova que circulava entre barbeiros, mamíferos e, talvez humanos.
Em 1909, ao examinar uma criança febril
descobriu em seu sangue aquele mesmo protozoário encontrado nos barbeiros e nas
diversas espécies de animais examinados, bem como semelhanças nos sintomas.
O grande cientista estudou a morfologia
e a biologia do parasita no hospedeiro vertebrado e invertebrado, seus reservatórios e diversos aspectos e
sintomatologia pertinentes a fase aguda do Trypanosoma
cruzy. (CHAGAS, 1909).
Atualmente a doença de Chagas no Brasil e
nos países da América Latina um problema médico-social grave. No Brasil atinge
8 milhões de pessoas, principalmente a população pobre que residem em condições
precárias. Constitui uma das principais causas de morte súbita que pode ocorrer
com freqüência na faze mais produtiva do cidadão, segunda a OMS.
MORFOLOGIA
O T.
cruzy possui seu ciclo biológico nos hospedeiros vertebrados e invertebrados
e várias formas evolutivas.
Hospedeiro Vertebrado
Na cultura de tecidos são encontradas
intracelularmente as formas amastigota,e extracelularmente as formas
tripomastígotas sendo formas infectantes para células in vitro e para vertebrados.
Os tripomastigotas sanguineos apresentam
variações morfológicas denominadas “polimorfismo” que guardam correlações
importantes com outras características fisiológicas do parasita. Ao longo da
infecção surgem tripomastigotas sanguineos delgado, intermediários ou largos.
As formas delgadas seriam mais infectantes para células, desenvolvendo
parasitemia mais precoces, porém mais sensíveis á ação de anticorpos
circulantes. Formas largas menos infectantes, demoram mais para penetrar na
célula, desenvolvendo parasitemias mais tardias porem mais resistentes a ação
de anticorpos.
Os tripomastigotas delgados são menos
capazes de desenvolver no vetor que os tripomastígotas largos, diferindo também
o tropismo celular. Tripomastigotas delgado parasitam células do sistemas
mononuclear fagocitário (macrofagotrópicas). Cepas que apresentam formas largas
tem tropismo por células musculares lisa, cardíaca e esquelética (miotropicas).
Formas delgadas são mais freqüente no inicio da infecção do hospedeiro
vertebrado, quando ainda não existe uma imunidade humoral especifica para o
parasita, sendo posteriormente substituída pelas formas largas mais resistentes
a ação de anticorpos predominando na fase mais tardia da infecção quando a
imunidade já se estabeleceu.
Hospedeiro Invertebrado
Inicialmente encontra-se formas
arredondadas com flagelo circundando o corpo, denominadas esferomastigotas
presentes no estomago e intestino do triatomíneo. Formas epimastígotas
presentes em todo o intestino e tripomastígotas presentes no reto. O
tripomastígota metacíclico constitui a forma mais natural de infecção para o
hospedeiro vertebrado.
BIOLOGIA
O ciclo biológico do T. cruzy é do tipo
heteroxênico, passando o parasita por uma fase de multiplicação intracelular no
hospedeiro vertebrado e extracelular no inseto vetor.
Imagem: pt.wikipedia.org
Ciclo Biológico no Hospedeiro Vertebrado
Amastigotas, epimastigotas e
tripomastigotas interagem com células do hospedeiro vertebrado e apenas as
epimastigotas não são capazes de nelas se desenvolver e multiplicar.
Considerando o mecanismo natural de
infecção pelo T. cruzi, os tripomastígotas metacíclicos eliminados nas
fezes e urina do vetor, durante ou logo após o repasto sanguíneo, penetram pelo
local da picada e interagem com células do SMF da pele ou mucosas. Neste local,
ocorre a transformação dos tripomastígotas em amastígotas, que aí se
multiplicam por divisão binária simples.
A seguir, ocorre a diferenciação dos
amastígotas em tripomastígotas, que são liberados da célula hospedeira caindo
no interstício. Estes tripomastígotas caem na corrente circulatória, atingem
outras células de qualquer tecido ou órgão para cumprir novo ciclo celular ou
são destruídos por mecanismos imunoló-gicos do hospedeiro.
Podem ainda ser ingeridos por
triatomíneos, onde cumprirão seu ciclo extracelular. No início da infecção do
vertebrado (fase aguda), a parasitemia é mais elevada, podendo ocorrer morte do
hospedeiro. Na espécie humana, a mortalidade nesta fase da infecção ocorre
principalmente em crianças. Quando o hospedeiro desenvolve resposta imune
eficaz, diminui a parasitemia e a infecção tende a se cronificar.
Na fase crônica, o número
de parasitas é pequeno na circulação, só sendo detectados por métodos especiais
(xenodiagnóstico, hemocultura e inoculação em camundongos — ver diagnóstico). A
evolução e o desenvolvimento das diferentes formas clínicas da fase crônica da
doença de Chagas ocorrem lentamente, após 10 a 15 anos de infecção ou mais.
Experiências in vitro demonstram
que o mecanismo de interação entre o parasito e as células do hospedeiro
vertebrado denomina-se “endocitose”, no qual participam ativamente a célula e o
parasito. Componentes de membrana de ambos, alguns com composição e peso
molecular já conhecidos, interagem entre si.
A interação entre o parasito e a célula
hospedeira ocorre em três fases sucessivas
1) Adesão celular: quando ambos se reconhecem e o
contato membrana-membrana ocorre;
2) Interiorização: quando ocorre a formação de pseudópodes
e a consequente formação do vacúolo fagocitário. A concentração de Ca2+ tem
sido também considerada um fator importante na penetração do parasita na célula
hospedeira e facilita a chegada dos lisossomas para as proximidades do parasita
chegando mesmo a fazer parte da membrana do vacúolo fagocitário;
3) Fenômenos
intracelulares:
quando as formas epimastígotas são destruídas dentro do vacúolo fagocitário
(fagolisossoma) e os tripomastígotas sobrevivem resistindo às ações das enzimas
lisossômicas e desenvolvendo-se livremente no citoplasma da célula, onde se
transformam em amastígotas (três horas após a interiorização).
Em cultivo do T. cruzi em
macrófagos foi verificado que os amastígotas se multiplicam por divisão binária
simples, a cada 12 horas, num total de nove gerações, totalizando cerca de 540
parasitos, que a seguir se diferenciam em tripomastígotas por um mecanismo
denominado “alongamento”.
A célula hospedeira,
repleta de parasitos, se rompe, liberando no interstício os tripomastígotas ou
mesmo amastígotas que ainda não se diferenciaram, além de detritos celulares da
célula hospedeira.
Ciclo biológico no hospedeiro invertebrado
Os triatomíneos vetores se infectam ao
ingerir as formas tripomastígotas presentes na corrente circulatória do
hospedeiro vertebrado durante o hematofagismo. No estômago do inseto eles se
transformam em formas arredondadas e epimastígotas. No intestino médio, os
epimastígotas se multiplicam por divisão binária simples, sendo, portanto,
responsáveis pela manutenção da infecção no vetor.
No reto, porção terminal
do tubo digestivo, os epimastígotas se diferenciam em tripomastígotas
(infectantes para os vertebrados), sendo eliminados nas fezes ou na urina. Esta
é a descrição clássica adotada para o ciclo do T. cruzi no invertebrado.
Outros estudos revelaram que os
tripomastígotas sanguíneos ingeridos se transformariam no estômago do vetor em
organismos arredondados, denominados esferomastígo-tas, circundados ou não por
flagelo e que têm um importante papel no ciclo biológico do vetor.
Estes esferomastígotas poderiam se
transformar em tripomastígotas metacíclicos
infectantes ou em epimastígo-tas de dois tipos: epimastígotas curtos, capazes
de se multiplicar por divisão binária simples e então se transformar novamente
em esferomastígotas que dariam os tripomas-tígotas metacíclicos, ou
epimastígotas longos, que não se multiplicam e nem se diferenciam para
tripomastígotas metacíclicos.
MECANISMOS
DE TRANSMISSÃO
Pelos vetor a infecção ocorre pela
penetração de tripomastigotas metaciclicos em solução de continuidade da pele
ou mucosa íntegra.
Transfusão sanguinea é um
mecanismo de transmissão.
A transmissão congênita ocorre quando
existem ninhos de amastigotas na placenta, que liberariam tripomastigotas
chegando a circulação fatal.
Acidentes de laboratório se da pela
contaminação do parasita com a pele lesada, mucosa oral ocular ou
auto-inoculação.
Transmissão oral como a amamentação, animais
ingerido triatomídios infectados, canibalismo entre diferentes espécies de
animais, ingestão de alimentos contaminados com fezes ou urina de triatomidios
infectados.
Coito havendo apenas relato de encontro de
triapomastigotas em sangue de mestruação de mulheres chagásicas e no esperma de
cobaios infectados.
Transplante de órgãos
infectados podendo desencadear faze aguda grave.
A
DOENÇA
Sintomática ou
assintomática, ambas relacionada com o estado imunológico do hospedeiro. As
manifestações gerais são representadas por febre, edema localizado e
generalizado, poliadenia, hepatomegalia, esplenomegalia, insuficiência cardíaca
e perturbações neurológicas.
Fase aguda, fase crônica
Assintomática, fase crônica Sintomática, forma cardíaca, forma digestiva e
forma nervosa.
DIAGNÓSTICO
Clínico
- Sinal de Romanã e
chagoma de inoculação. Febre, adenopatia-satélite ou generalizada,
hepatoesplenomegalia, taquicardia, edema.
Laboratorial
– Na fase aguda
observa-se alta parasitemia, presença de anticorpos inespecíficos e inicio de
formação de anticorpos específicos (IgM e IgG). Na fase crônica, baixíssima parasitemia,
presença de anticorpos específicos (IgG).
Fase
Aguda – Exames Parasitológicos:
Exame de sangue a fresco, exame de sangue em gota espessa, esfregaço sanguineo
corado pelo Giemsa, cultura de sangue ou material de biópsia, inoculação do
sangue, método de concentração, o xenodiagnóstico e a hemocultura.
Fase
Aguda – Exames Sorológicos:
Reação de precipitação ou precipita, reação de imunofluorescência indireta (RIFI),
enzime-linked-immunosorbent-assay (ELISA).
Fase
Crônica – Exames Parasitológicos:
Xenodiagnóstico, Hemocultura, inoculação em camundongos jovens.
Fase
Crônica – Exames Sorológicos:
O diagnóstico sorológico evidencia a presença de anti-corpos específicos no
soro do paciente. Técnica antiga a de Reação de fixação de complemento (RFC) ou
de Guerreiro e Machado. Existem também os exames de Reação de
imunofluorescência indireta (RIFI), reação de hemaglutinação indireta (RHA). enzime-linked-immunosorbent-assay
(ELISA). Lise mediada por complemento (LMCo). Pesquisa de anticorpos
antitripomastigotas vivos (AATV).
Método
Parasitológico-Molecular:
Reação em cadeia da polimerase (PCR).
Critério
de Cura - Vários
métodos de exames laboratorias são indicados como critério de cura:
I – Parasitológico:
Xenidiagnóstico (Xd) e hemocultura (Hc);
II – Parasitológico molecular
(PCR);
III – Sorológico convencionais
(RIFI, ELISA, RHA etc);
IV – Sorológico nã´-convencionado
(LMCo e pesquisa de AATV por citometria de fluxo);
EPIDEMIOLOGIA
Segundos dados recentes
da OMS doença de Chaga atinge 16 a 18 milhões de habitantes de 18 países,
causando 21.000 mortes anuais e uma incidência de 300.000 novos casos por ano.
No Brasil, cerca de 6 milhões de habitantes são infectados. Ela se distribui em
duas zonas ecológicas distintas: Cone Sul, onde os insetos vetores vivem em
habitações humanas, e o outro, constituído pelo sul da América do Norte,
América Central e México, onde o vetor vive em ambos os ambientes, dentro e
fora do domicílio.
PROFILAXIA
Melhoria nas habitações
rurais, combate ao barbeiro, controle do doador de sangue, controle de transmissão
congênita, vacinação.
TRATAMENTO
A terapêutica da doença
de Chagas continua parcialmente ineficaz. Diversas drogas vêm sendo testadas em
animais e algumas delas têm sido usadas no homem. Alguns medicamentos
NIFURTIMOX que age nas formas sanguineas e parcialmente contra as formas
teciduais. BENZONIDAZOL possui efeitos apenas contra as formas sanguineas. Uso
dos derivados azólicos ou de citocinas associdas as benzonidazol em modelos
experimentais, vêm se constituindo em potenciais tratamentos para a infecção.
Imagem livro Parasitologia humana: submarino.com.br
Imagem barbeiro: Imagem: unicamp.br
Imagem ciclo de vida: pt.wikipedia.org
Parasitologia humana
/ [editor] David Pereira Neves. — 11. ed. — São Paulo : Editora Atheneu, 2005.
Site: www.atheneu.com.br